Um bom café da manhã com Ricardo Quadros Gouvêa:
Uma igreja é uma
família da fé que reproduz em seu microcosmo a realidade social. Numa família
encontramos pessoas de todo tipo: abastadas e necessitadas, cultas e incultas,
jovens e idosas, e com preferências distintas. Assim é em uma igreja saudável,
e isso nos ensina a sermos respeitosos e pacientes uns com os outros. Martin
Buber alerta: “Quando amamos somente
aqueles que se parecem conosco, não amamos ao próximo, mas antes a nós mesmos
refletidos no próximo”.
Qualquer igreja com mais de mil membros corre
sérios riscos de degenerescência, de perda das características que determinam
sua existência como comunidade cristã. O ideal hipermoderno de igrejas grandes
e poderosas deve dar lugar ao resgate do valor das eclesiais em que a
preocupação não é numérica ou financeira, mas humana e espiritual. A boa igreja
não é aquela que nos proporciona um bom “show” dominical, impessoal e
superficial, mas aquela onde encontramos a nutrição espiritual da comunhão
fraternal com os que sabem nosso nome, onde todos são iguais, não por causa de
uma estratégia secular, mas porque todos, apesar das diferenças, se amam e se
respeitam, e tem em Cristo como o cabeça, e nós somos diferentes órgãos (1Co
12).
Os maiores
expoentes da espiritualidade cristã foram todos sofredores. No século quatro,
Antão vivia numa caverna, miserável, considerado louco, mas venerado por sua
santidade. Francisco de Assis, humilhado pelos cardeais e papas, morreu aos 44
anos e é visto por muitos como o maior discípulo de Cristo que já viveu.
Juliana de Norwich nunca teve posses, foi considerada herege e, depois,
aclamada como sábia. David Brainerd, o missionário americano que abandonou tudo
para pregar o evangelho aos nativos de seu país, morreu aos 29 anos e deixou um
diário de meditações que até hoje nos comove. José Manoel da Conceição, o padre
protestante, que não viajava a cavalo, mas a pé e às vezes descalço, morreu
como um indigente aos 51 anos, incompreendido pelos missionários. Homens de
Deus, mas totais fracassos na cidade terrena onde o que conta é a fama, o
lucro, as posses, o poder, a saúde, o sucesso, a longevidade e a aparência
física.
Isso vale também
para as igrejas que querem ser como empresas bem-sucedidas: a busca do sucesso
mundano sancionado por uma falsa fachada de sacralidade. Mefistófeles promete de novo a Fausto a felicidade em troca de sua
alma. Vender-se ao “espírito” mercadológico do nosso tempo, em que impera o
maquiavelismo, é vender a alma, abandonando princípios e valores que, para um
cristão, são inegociáveis.
Sem comentários...
Um dia de evangelho simples, como deve ser.
• Ricardo Quadros
Gouvêa é ministro presbiteriano e professor da Universidade Presbiteriana
Mackenzie e do Seminário Teológico Servo de Cristo.
Como vc mesmo encerra a meditação: sem comentários! Disse quase tudo.
ResponderExcluir